Que coisa mais triste é ver gente dizendo que alguém teve “sorte” quando esse alguém veio da classe baixa e sem nenhum tipo de privilégio ou prêmio da loteria, mas conseguiu melhorar de vida.
Eu nasci e cresci em família
pobre, e vez ou outra alguém me diz que “Pi, mas você teve sorte”, pois eu digo
que sorte foi uma das poucas coisas que tive na minha vida. O que eu sempre tive
foi esforço, consciência e uma proteção de Deus essa última que não faço
por merecer.
Enquanto eu crescia nunca tive
condições de cursar escola particular ou de cursinhos de idioma ou pré-vestibular,
sempre tive que me contentar com a velha escola pública brasileira e a internet
para tentar aprender o máximo que eu conseguia. Vários colegas da minha idade
vinham de famílias que conseguiam bancar estudos de primeira linha, mas confesso
que não vi nenhum deles saber tirar proveito disso.
Quando passei no vestibular e
fui cursar a faculdade a minha vida não era nada fácil, eu tinha exatos 30
minutos entre bater o ponto de saída no meu trabalho e o ônibus fazer a única
saída do dia pra faculdade (não esqueçam que moro em cidadezinha de interior) em
outra cidade. Quantas vezes não tive que me virar nos trinta debaixo de
temporal pra não perder o ônibus, tinha que ir a pé até o ponto de ônibus e
acabava me molhando. Vários alunos que iam também pra faculdade, conseguiam ir
de carro pra faculdade ou pelo menos até o ponto de ônibus, nessas horas eu
perguntava a Deus: o senhor é justo comigo? Ele me respondia, mas a resposta de
Deus nem sempre conseguimos entender na hora.
Na faculdade eu sempre tentei tirar
o máximo possível das aulas, tinha bons, ótimos e péssimos professores, mas
independente do quão difícil fosse a matéria ou estressante fosse o meu dia, a
faculdade sempre foi meu lugar preferido, lá conheci também meus melhores
amigos.
Infelizmente quando arranjei
um emprego eu aprendi logo cedo a ter que gastar pouco, na época ganhava um
salário mínimo. Acabou que nunca consegui participar de festas universitárias e
“saideiras” pra bares, eu nunca tinha dinheiro, na verdade às vezes sobrava um
pouquinho, mas eu tinha tanto medo de perder o emprego e não ter como continuar
estudando que comecei a guardar desde cedo esse dinheiro.
No trabalho acabei conseguindo
uma promoção quase um ano depois de ser contratado, a promoção dava um up no
meu salário, eu passava a ganhar cerca de 2 salários mínimos. Eu sempre me
considerei um funcionário mediano, não achava que fazia nada de especial, mas
meu chefe me disse tempos depois que eu nunca dei trabalho pra ele, sempre
cheguei no horário, sempre me esforcei mesmo quando não sabia fazer as coisas e
sempre que ele me passou uma tarefa eu corria atrás de fazer, os outros colegas
do meu setor e de mesmo cargo eram mais largados, e esses mesmos colegas disseram
que eu tinha sorte de ser promovido e que não merecia, pois era só um recém-chegado
e eles estavam a mais tempo.
É a partir dessa promoção que
começou a sobrar dinheiro, mas resolvi que o aumento precisava ser poupado,
claro que consegui separar um pouquinho pra sair uma vez ou outra no mês pra
tomar um refrigerante na faculdade e comer um salgado, mas a prioridade era
guardar dinheiro.
E foi apenas seis meses depois
dessa promoção que surgiu uma nova promoção, a partir daí eu fui promovido ao
cargo dos sonhos no departamento, o salário dobrou mais uma vez, e havia alguns
bônus e tudo mais. Continuei poupando dinheiro o máximo possível, com o passar
dos meses eu ia guardando cada vez mais e construindo uma reserva. Os colegas
de trabalho continuavam gastando todo o salário e na faculdade o que não faltava
era gente gastando tudo em bebidas e festas universitárias. Como sempre tiver perfil
anti-social e meu círculo de amizade também, nunca fui nessas festas.
Nessa época da faculdade
conheci aquela que eu imaginei ser “o amor da minha vida”, infelizmente não era
nada disso, confesso que me apaixonei e eu tinha poucas experiências amorosas
na vida, levou alguns meses pra mim cair na real que ela só queria me sugar, ela
não era quem parecia ser (ou quem eu queria que fosse?), e que não ia rolar
nada além da friendzone, meus amigos me avisaram e resisti em acreditar,
até que percebi a realidade de uma forma não agradável, decidi cortar
completamente qualquer contato, confesso que demorei muito mais tempo pra esquecer,
mas sabia que cedo ou tarde ela seria só passado e um tempo depois foi isso que
aconteceu.
Mais ou menos na mesma época
que eu me metia nessa “ilusão amorosa” começou a martelar na minha cabeça que por
mais que eu tivesse um cargo bacana na empresa, eu estava muito distante da
minha área de graduação e eu queria voltar pra esse caminho, pois não queria
ter um diploma debaixo do braço e não aplicar na prática. Nesse meio tempo resolvi
mandar um currículo para outra empresa que descobri que abriria uma vaga. Uns
dois meses depois surgiu uma ligação perguntando se eu gostaria de participar
do processo seletivo? Topei. Fui aprovado.
O novo emprego veio e novamente
acompanhado com as conversas de que eu tinha sorte por parte de quem mal me
conhecia, inclusive alguns familiares começaram a ficar com “inveja” (???) e
fazer comentários depreciativos sobre mim. No novo emprego consegui bons ganhos
salariais e meses depois rolou uma promoção para o cargo que ocupo até hoje.
Acabei me formando na
faculdade.
Depois da faculdade resolvi
que precisava priorizar minha vida, com uma parte da grana que eu tinha guardado
acabei comprando meu carro (um passivo vital no interiorzão) e agora tinha
liberdade para ir e vir (e o fim dos banhos de chuva). Também percebi que tinha
problemas com ansiedade e na época resolvi dar uma mudada de vida e comecei a
perder peso, foram 20kg em pouco mais de um ano.
Comecei a controlar minha vida
financeira em planilhas, e a melhorar meus aportes, passei a acompanhar de
perto a rentabilidade dos meus investimentos e a melhorar meus aportes. Busquei
melhorar meu desenvolvimento profissional com cursos e finalmente chegamos aos
dias atuais...
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O que digo é que minha vida
não foi fácil, sempre fui pobre, nasci em família humilde e meus pais nunca
tiveram empregos de classe média ou as mesmas oportunidade de estudo que eu
tive, nunca fui bom em esportes, nunca fui o popular da sala, nunca fui o que
as meninas se ofereciam pra ficar, sempre
tive consciência de que a vida não é justa, que eu estava na corrida da vida como
os outros, mas que a corrida não era igual para todo mundo, alguns largavam na
frente e que cabia a mim me esforçar para alcançar os outros.
Nunca quis ser "o melhor", meu único objetivo é ter uma vida normal, ser um cara mediano, com tranquilidade financeira e boa saúde, não quero ser famoso, não quero ser um desses bilionário, só quero viver a vida com dignidade.
Não tenho uma vida perfeita, tenho muitos problemas, mas confesso que sinto orgulho de quem sou e até onde já cheguei.